A ELEIÇÃO DO CONSELHO MUNICIPAL PARTICIPATIVO EM SÃO PAULO FOI LEGÍTIMA?

Por Carlos Galdino

Irregularidades e denúncias são apresentadas pela população

Por Carlos Galdino

A eleição do Conselho Municipal Participativo em São Paulo, ocorrida no último dia 15 de dezembro, foi marcada por diversas irregularidades e questionamentos que colocam em xeque a credibilidade do processo eleitoral. Criado para garantir a participação popular e dar voz às demandas locais nos territórios, o Conselho Municipal Participativo tem um papel fundamental na representação das comunidades junto à administração pública. Contudo, a organização do pleito e os diversos problemas verificados geraram revolta entre eleitores, candidatos e líderes comunitários.

A Importância do Conselho e o Processo Eleitoral

O Conselho Municipal Participativo é uma instância de representação que busca fortalecer o protagonismo popular em cada subprefeitura de São Paulo. Seu principal objetivo é acompanhar as ações do poder público, apresentando demandas e propondo soluções para problemas locais.

Neste ano, 2.148 candidatos se inscreveram para disputar as 608 vagas disponíveis nos conselhos municipais participativos da capital paulista. Esse número representa um crescimento expressivo em comparação com a última eleição de 2022, que teve apenas 574 candidatos. O aumento do interesse está diretamente relacionado ao papel essencial do conselho, que recebeu, nos últimos dois anos, R$ 12 milhões cada para projetos nas subprefeituras.

Segundo a prefeitura, cerca de 40 mil pessoas compareceram aos locais de votação, um número quatro vezes maior que o pleito anterior. Contudo, a estrutura precária e as irregularidades do processo deixaram evidente a falta de planejamento e comprometimento das autoridades.

Desorganização e Falta de Estrutura

Desde cedo, eleitores enfrentaram longas filas e relatos de desorganização se multiplicaram em diversas regiões da cidade. Filas imensas, demora excessiva e tumultos foram registrados em bairros periféricos como M’Boi Mirim, Santo Amaro, Cachoeirinha, Jaçanã, Tucuruvi, Perus, Cidade Tiradentes e São Miguel. Até em regiões centrais, como Vila Mariana, houve problemas semelhantes.

Em um vídeo recebido pela reportagem, um homem segurava a senha 1.051, por volta das 12h30, na unidade do Descomplica no Itaim Paulista, na zona leste. A espera levou muitos eleitores à desistência, enquanto outros chegaram a passar mal nas filas.

"Cheguei às 9h da manhã e já havia uma fila imensa. Esperei quase duas horas para votar", afirmou Maria Cristina, moradora da Zona Leste. Outros relatos denunciam que havia apenas um computador funcionando em alguns locais, atrasando ainda mais o processo.

A prefeitura, por sua vez, declarou que foram convocados 1.260 funcionários e 18 técnicos da Prodam para atuar nos locais de votação. Ainda assim, o caos foi generalizado.

Práticas Ilegais e Falta de Lisura

Além da desorganização estrutural, o pleito foi marcado por práticas ilegais e falta de fiscalização. Houve denúncias de compra de votos, boca de urna, transporte irregular de eleitores e até troca de votos por cestas básicas. As práticas foram amplamente observadas, sobretudo nas periferias da cidade.

"Vimos vários carros parando com gente para votar e depois levando de volta. Estão cooptando eleitores com benefícios e promessas", denunciou um candidato da região Norte, que pediu anonimato.

Outro fator preocupante foi o registro de eleitores fotografando seus votos como prova para candidatos que realizavam coação ou troca de favores, uma prática proibida por lei.

Sistema de Votação Questionável

O sistema de votação também foi alvo de severas críticas. Em vez de utilizar urnas eletrônicas, o processo foi conduzido por computadores, o que levantou dúvidas sobre a segurança e a transparência da eleição. Além disso, muitos eleitores relataram problemas com a ausência de nomes e números de candidatos na tela, levando a confusão e erros na escolha.

"Não achei o nome do meu candidato. Reclamei, mas disseram que era um problema do sistema. Isso é um absurdo!", relatou José Luiz, morador da Zona Sul.

A Influência Política e a Coaptação de Lideranças

Outro ponto grave foi a interferência de vereadores, que, segundo denúncias, cooptaram líderes comunitários para atuarem como conselheiros sob sua direção e interesses. Tal prática compromete o caráter independente do Conselho, que deveria ser um espaço autônomo de representação popular.

"O Conselho deveria ser independente, mas o que se viu foram candidatos ligados a políticos, o que compromete o caráter popular do processo", criticou um observador.

Falsificação de Endereços e Fraudes

Outra irregularidade recorrente foi a falsificação de declarações de endereço para burlar o sistema eleitoral. Houve relatos de eleitores que votaram sem apresentar comprovante válido de residência, comprometendo a legitimidade do processo.

O Papel da Guarda Municipal e a Falta de Fiscalização

A Guarda Civil Metropolitana, que deveria atuar para coibir as irregularidades, foi acusada de inércia. "Vi vários casos de boca de urna acontecendo na frente dos fiscais, e nada foi feito. A sensação é de abandono", criticou uma eleitora.

Problemas Sistêmicos e Generalizados

As irregularidades não se limitaram a uma região específica. Relatos de fraudes, desorganização e interferência política foram registrados em todas as 32 subprefeituras. A falta de planejamento e transparência evidenciou que a prefeitura não deu a devida atenção à eleição, desrespeitando tanto os candidatos quanto os eleitores.

Consequências e Questionamentos

A soma de todos os problemas registrados coloca em xeque a legitimidade dos eleitos e levanta questionamentos sobre a validade do processo. Especialistas alertam que, sem uma estrutura adequada e fiscalização rigorosa, os Conselhos Municipais perdem sua capacidade de representar as demandas da sociedade civil.

Conclusão: A Necessidade de Reformar o Processo

O Conselho Municipal Participativo tem uma importância inquestionável para a democracia em São Paulo. Contudo, o pleito deste ano revelou falhas estruturais, práticas ilegais e descaso das autoridades com o processo.

A população espera que as irregularidades sejam investigadas, os responsáveis punidos e que as próximas eleições garantam transparência, segurança e representatividade. A democracia participativa só poderá ser fortalecida se houver comprometimento das autoridades e respeito aos eleitores.

A cidade de São Paulo merece eleições justas, limpas e organizadas, onde a vontade popular prevaleça sobre os interesses particulares e políticos.

Carlos Galdino, Bacharel em Direito e Membro do Conselho do Plano Municipal do Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas da Cidade de São Paulo, é colaborador nos jornais Expresso Periférico, Tribuna Escrita, Rádio Cantareira FM e Coordenador e apresentador do Sarau do Jabaquara